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quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Ratos



Passam o dia dentro do escritório enegrecido pela sua própria silhueta. Os prédios em volta crescem, para eles como cogumelos. Plenos de alucinações, inundam-nos com o pó do asfalto que entorpece os movimentos mas também os fascina e fá-los trabalhar maquinalmente. O objectivo cumprido, os números batem certo e excedem expectativas. A alegria contagiante de mais um dia de imensa produtividade ineficaz e ineficiente. Tocam algumas badaladas, e a toque de caixa a saída é anunciada. Todos se dirigem para fora, o exterior, seguem os indicadores digitais, pré-programados e pré-fabricados que lhes indicam os destinos predestinados em frisada redundância. Destinos esses sempre fugazes, gentes que amanhã partem e se apagam como o semáforo que se acende na plataforma que cresce de pessoas em ebulição. Que se amontoam nos percursos. Aumentam à velocidade da partida enquanto outros encontram a chegada. Movimentos inconstantes e constantes. Caminhos conhecidos plenos de aglomerados desconhecidos. Gente adormecida circula na rua. Outros acordam e gritam, e falam do regresso do absurdo da vontade própria. Em vão.


e foram.



são esquecidos.



Passa-se por eles




e o semáforo verde.


As portas abrem e os carris seguem o seu caminho pelo tubo incolor e vazio de sentimento. Indolor. Pára mais uma vez e sobem as escadas.

A multidão expectante observa os painéis. O tempo não lhes obedece e continua. leva-os para longe, para um lar por instantes, para algo familiar por momentos, esfuma-se num cruzamento. O comboio arranca-os do espaço.

Sai-se novamente, espera-se pela sirene. arrancam! trocam olhares a medo, estranha-se o lugar reconhecido, segue-se em frente. As pálpebras fecham. Os carris em recta, comunicações em todos os sentidos diálogos perdidos e escutados em todas as direcções. pensamentos cruzados.


Tanta vida junta,


Pulsam com a energia electrica que os alimenta. Vivem viciados na roda do amanhã. Como o roedor, imunes à dor, em mentes pesadas. Dormentes pelo peso da carruagem que os conduz. Paragem à frente. sente-se a mágoa e o riso. Misturam-se num batido e mais um café servido de demência e rasgos de sanidade entre cortados por loucura calculada e à distância de um banco e de mais um lugar que vaga. Assim como uma mente.


passa mais um dia,




o indicador luminoso aponta,




e a sirene assinala.

2 comentários:

mitro disse...

Também tá bom (quase como os Kraftwerk).

Porcelain disse...

Ai que fixe... gostei mesmo deste...

Haverá produtividade que não seja ineficaz? Ineficiente? Todos fazem tudo ao mesmo tempo... vontade própria? Não estou certa de que exista fora das nossas alucinações...

Vivem viciados na roda do amanhã e esquecem-se... esquecem-se de viver o hoje e transformam o hoje, o amanhã e o ontem em dias todos iguais... todos o mesmo dia...

Deixemos os indicadores luminosos e sonoros fazer por nós todo o trabalho... é mais fácil...