terça-feira, 19 de janeiro de 2010
Amargura infinita - citação
" - Ah! meu caro Lúcio, acredite-me! nada me encanta já; tudo me aborrece, me nauseia. Os meus próprios raros entusiasmos, se me lembro deles, logo se me esvaem - pois , ao medi-los , encontro-os tão mesquinhos, tão de pacotilha...Quer saber? Outrora, à noite, no meu leito, antes de dormir, eu punha-me a divagar. E era feliz por momentos, entressonhando a glória, o amor, os êxtases...Mas hoje já não sei com que sonhos me robustecer. Acastelei os maiores...eles próprios me fartaram: são sempre os mesmos - e é impossível achar outros...Depois, não me saciam apenas as coisas que possuo - aborrecem-me também as que não tenho, porque, na vida, como nos sonhos são sempre as mesmas. De resto, se às vezes posso sofrer por não possuir certas coisas que ainda não conheço inteiramente, a verdade é que, descendo-me melhor, logo averiguo isto: Meu Deus, se as tivera, ainda maior seria a minha dor, o meu tédio...De forma que gastar tempo é hoje o único fim da minha existência deserta. Se viajo- se vivo, numa palavra, creia-me: é só para consumir instantes. Mas dentro em pouco(já o pressinto) isto mesmo me saciará. E que fazer então? Não sei...não sei... Ah!, que amargura infinita..."
Mário de Sá Carneiro - A confissão de Lúcio(1914)
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário