Numa patrulha de vigia, saímos da densa floresta e vamos em direcção a uma aldeia não assinalada no mapa, deparamo-nos com uma paisagem estéril, quase o fim do mundo, um inferno na Terra. Parecia ter sido afectada por todos os cataclismo conhecidos pela humanidade. Passamos por Ubandi, que parou no tempo, na idade medieval. É como se atravessássemos uma zona afectada por uma epidemia, as ruas enlameadas onde proliferavam as larvas e mosquitos portadores de malária e sabe-se lá mais o quê. As casas, as que estavam de pé, feitas de madeira bolorenta devido à antiguidade dos materiais e à humidade, com a integridade desmanchada, os telhados caídos e as janelas com plasticos rasgados a fazer de vidros. Uma divisão que servia de cozinha, quarto de dormir, sala de estar e latrina, os cheiros misturavam-se, era nauseabundo, um odor adocicado de podridão. No chão brincam crianças subnutridas, jogam à guerra com paus como tropas e calhaus como bombas que atiravam ao chão barrento. Numa casa, uma criança dava de beber a um casal deitado, talvez os pais, que padecia duma enfermidade qualquer, a pele de cor amarelada e a textura parecida a cera,uns olhos vazios e tristes, olhavam-nos como que dissessem que não há futuro nem esperança naquele lugar esquecido pelos homens, por Deus e até pelos próprios habitantes, pois naquele lugar a morte encontrava-se em cada esquina, à espreita . Onde a esperança média de vida era reduzida, e o homem mais velho tinha 39 anos, e a pessoa mais antiga era uma matriarca com os seus veneráveis 60 anos, mas que aparentava ter mais de 100. Na unica casa de tijolo, sentava-se o chefe da aldeia que fumava cachimbo de água, em cima dum carrinho de compras modificado para cadeira de rodas, amputado de ambas as pernas, dizia-nos algo, talvez em jeito de prece ou quem sabe de maldição. Falou-nos nos anos sucessivos de guerra, bombardeamentos de fósforo branco e napalm, de doenças, de massacres, de torturas que levaram todos os jovens de sexo masculino. E duma população que chegou a ter mais 1000 habitantes não seriam agora mais de 70, muitos que sucumbiram em batalha de guerrilha, outros fugiam para as montanhas e havia ainda familias que fugiam do País tentando recomeçar a ter finalmente, uma vida, longe dali, sem voltarem a dar notícias, cortando definitivamente os laços familiares, talvez por necessidade de esquecer aquele lugar. O resto das gentes, saiam das casas para nos ver passar. Olhavam-nos com expectativa, como se trouxessemos algo de novo, como se esperassem a salvação. Miúdos, juntaram-se à volta dum camarada, que nada tinha para dar, e apenas abrira um volume de tabaco dando cigarros a vulso aos que faziam uma fila, como se lhes ofertassem o maná dos céus. Os animais, gado e caes e gatos ocupavam o mesmo espaço que as pessoas, a qualquer ruido mais estridente dos motores da nossa comitiva, ou um barulho desconhecido, corriam assustados escondendo-se debaixo das estacas que sustentavam a entrada das barracas. A maior parte das árvores à tinham sido cortadas, ardiam nas lareiras e braseiros improvisados, que serviam de fornos e fogões para cozinhar ou ferver a água que se encontrava contaminada. Um ancião esfarrapado e sujo de lama, acenava com um bidon pedindo-nos gasolina, havia carros e motorizadas, mas há muito que deixaram de funcionar, o combustível exigido era para alimentar o único gerador que servia a povoação, e apesar de haver um sistema de abastecimento electrico nas habitações, precisavam dele para o rádio, única forma de contacto com o mundo exterior. Numa população de quase 70 pessoas, talvez houvesse umas 5 ou 6 aptas para trabalhar, sendo a única actividade da aldeia a pesca e o cultivo muito artesanal de produtos hortícolas, o gado morria aos poucos, pois já não havia forragens, e a flora à volta tinha sido cortada e ardida. Onde antes deveria haver uma selva virgem e rica, com uma diversidade imensa, estava agora um deserto, onde a terra se transformava em areia e pó, e o barulho dos animais autóctones, como aves de plumagem colorida, pequenos macacos semelhantes a babuínos e uma espécie de marupial parecido com um coala, era agora preenchido por um silêncio avassalador, cortado frequentemente por queixumes de enfermos e gritos de dor duma gente que definhava aos poucos.
sábado, 21 de março de 2009
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1 comentário:
o que é que foste fazer para esse sítio?
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