LXIV - Justiça
Quim vivia na aldeia fazia já 20 anos. Não trabalhava, vivia de biscates aqui e ali. Pedia esmola à porta da igreja. Aliciava as mulheres a troco de dinheiro. Contava historias longas e aborrecidas na tasca onde perdia o tempo e se endividava para beber mais um litro de vinho. Os vizinhos, já não tinham paciência para tanta efusividade. Tornava-se agressivo verbalmente, e destruia tudo por onde passava quando se encontrava bebedo. A sua violência não tinha limites, era um ser anti-social e execrável.
Numa madrugada quando se preparava para mais um dia de futilidades, uma multidão encontrava-se à sua porta. Sentiu uma primeira pancada na nuca. Dois murros certeiros na cabeça e vai ao chão. O peso das botas, que lhe entram pelas costelas já não lhe causam dor, os paus certeiros no seu corpo, apenas lhe causam um torpor, uma dormência. Quando acorda encontra-se longe. Tanto ele como os seus pertences. Tudo empilhado num campo lavrado. Percebeu que voltar estava fora de causa. Perguntou-se que tinha feito para causar tanta raiva nos seus amigos e vizinhos. Questionava-se agora para onde ir. Custava-lhe andar, o sangue seco ao canto da boca, as nódas negras no corpo, as pernas doridas. Coxo, quase cego, dos iinchaços, confuso e perturbado. As dores agora eram maiores. Pela primeira vez encontrava-se sozinho. Sentia ódio por aquela gente, tinha dado tanto de si e era assim desprezado. Porquê? Perguntava-se vezes a fio. Gritava alto! o Eco chegava a aldeia. As gentes paravam e tremiam. Calafrios surgiam. Um horror surdo. Ninguém acreditava que voltasse. Quim levantou-se a custo novamente. Caia de novo. Tombava. Precisava dum copo. Mas não. Não ia voltar. Seguiu pela estrada. Esperava boleia...sentado...Encostou-se a uma árvore, deixou-se dormir... Acorda já a noite acaba. Tremuras e dores o consomem. Uma raiva cresce, está sozinho e sente-se abandonado e desprezado. pergunta-se porquê? Não tem respostas. Só pensa em vingança e em destruição. Como foram capazes? quem é aquela gente? Que direito têm sobre ele? Não! Vai voltar atrás. Não pode passar impune esta manifestação de ódio. Tem uns trocados no bolso, é tudo o que lhe resta...Pede boleia para trás...chega antes da madrugada com dois cantis de gasolina. Despeja-o sobre a bomba de gasolina sobre a tasca, sobre os carros estacionados..Sobre as casas mais próximas, sobre o estábulo...tudo o que seja combustível!...Acende um cigarro. Mete-se num carro, destrava-o e atira-o ao poço. Deixa cair o fogo e tudo arde! Foge pela mata. Missão cumprida. É de novo um homem completo. A Justiça é cega...
segunda-feira, 13 de agosto de 2007
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